Obrigado a Ti! |
1.
Uma coisa não pode ser neutra, pois possui em si possibilidades. Quando dizemos “possibilidades”, queremos dizer “capacidade para algo”. Assim, se entendermos como conceito de “coisa” qualquer elemento passível de ser nomeado, diremos que a neutralidade é impossível, pois até mesmo o nome de uma coisa já lhe confere atributo. Ora, se podemos dizer sobre “aquela coisa” que ela se chama “isto”, como poderia esta mesma coisa ser neutra? O mesmo pode ser dito sobre as ideias.
No entanto, não falamos aqui sobre o “valor” de algo. Isto já é outra discussão. Se dermos a alguma coisa um “valor”, esta coisa precisa ser comparada a outra, ou posta em uma escala. Esta escala, ou grau de comparação, necessariamente precisaria estar graduada em valores máximos e mínimos, ou em valores opostos, como “bonito/feio, agradável/tedioso, alegre/infeliz etc.” Logicamente, e pela mesma razão, não é possível neutralidade através de julgamentos.
Se ainda aqui há dúvidas, lembra-te destas palavras de Cristo: “Essa é a nota mestra da salvação: o que vejo reflete um processo em minha mente, que se inicia com a minha idéia do que quero.” E assim encerramos a discussão com este axioma: a “vida”, e tudo o mais que se vê no mundo, é uma projeção, e não pode ser neutra, pois foi apenas posta aí fora por ti, e é o resultado de um processo equivocado de pensamento. Damos aqui Graças a Deus, pois um equívoco pode ser corrigido, e mesmo aquilo que não é neutro pode ser totalmente inofensivo.
Lembremos, no entanto, que o fato de algo não ser neutro não lhe confere realidade, conforme estudamos. Uma xícara não existe no Reino, mas seu atributo de “conter” reflete uma ideia, que aqui pode ser o atributo de xícaras, potes, copos, buracos ou recipientes de qualquer espécie. A mesma noção pode ainda ser estendida ao útero, à noção religiosa da Grande Mãe, a qualquer meio de transporte, ou ao estado de transição que se dá entre uma aparente coincidência e a atestação de um fato, que revela motivos que contém plausibilidade, ou ainda eventos relacionados a qualquer tipo de transição em geral, que traduz em si um atributo, permanente ou não, de conter “mensagens”, como nas premonições ou em certos tipos de sonhos. Portanto, a noção de “conter”, existindo como ideia, será atribuída a um sem-número de objetos no mundo físico, ou através do simbolismo de tais ideias. No caso da xícara, ela pode conter café ou chá. Se continuarmos este tipo de raciocínio com apenas estes três elementos, encheremos linhas e mais linhas de especulação simbólica.
Não é possível esgotar um símbolo. Nem o valor de algo pode ser universal. O dinheiro que vale em um país tem valor diferente em outro, e pode não ser sequer aceito em um terceiro. Não existem coisas neutras, ou coisas sem valor. Existem apenas as coisas, seus nomes e atributos, e algum uso.
2.
Convém lembrar que o “desapego” procura elidir o valor das coisas ao desvincular o objeto ao desejo. Este processo nada tem a ver com neutralidade. Apenas um insano desapegaria do uso sadio das coisas enquanto estiver neste mundo em um corpo, ou — já que estamos indo tão profundamente na metafísica — como imagem. É correto lembrar que o amor é a unidade de medida da sanidade. Quando amas verdadeiramente a um irmão, lembra-te de Deus. A noção de unidade se refaz em qualquer pensamento amoroso que tiveres, mesmo em relação aos ambientes. Já foi dito em outro lugar neste blog das sábias palavras de Chico Science: “deixar que os fatos sejam fatos naturalmente/ sem que sejam forjados para acontecer/ deixar que as coisas que lhe circundem estejam sempre inertes/como móveis inofensivos/para nunca lhe causar danos/sejam eles morais, físicos, ou psicológicos.” E eis aqui tudo demonstrado. Deixar os fatos “serem” é liberdade. O vento que beija teu rosto na praia, ou a criança que te dá abraços no jardim jamais serão neutros, mas são amorosos. Assim, o desapego é uma noção de relevância. O que é relevante para ti, neste mundo insano? Nada? Então continues a estender neste mundo o amor. Se “o que vejo reflete um processo em minha mente”, nada pode ser neutro, mas tudo pode ser apenas o estender do amor de Deus aqui neste mundo. Portanto, pense apenas com amor.
3.
E agora perguntamos: existe alguma coisa neutra? Ora, para que algo seja neutro, este algo não pode ser representado por nenhum tipo de ideia. A palavra portuguesa “neutro” vem do latim ne [nem]+uter, utra, utrum [um ou outro]. Ou seja, neutro seria “nem um, nem outro”. Este homem é feliz? Nem uma coisa, nem outra. Este carro é novo? Nem uma coisa, nem outra. Agora, diga: das coisas que experimentas em tua percepção diária, para quais podes dizer: “nem um, nem outro?”, a menos que seja um erro?
Há uma maneira de isso ser assim: devote indiferença àquilo que não existe, isto é, a tudo o que vês no mundo da percepção. No entanto, guarda para ti os pensamentos de amor, pois a pouco já ficaste com raiva também. Assim, eis o mundo retornado pacífico À Tua Santa Mente. E pedimos a Nosso Pai que venha até nós, para nos transportar pela “brecha”, esta “estreita fenda” que nos separa do Reino, e pedimos que seja para logo a compreensão empírica disto. Amém.
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