A culpa mora no “arrependimento”, pois o arrependimento provoca a culpa quando remonta a uma ideia
de punição. Pensamos que, diante de nossos erros, certamente algo pode ser
devolvido como punição. A culpa tenta, então, “demonstrar” que há no indivíduo
um atenuante, na forma de arrependimento, e que assim ele pode prosseguir na
vida, mesmo em erro. No entanto, a culpa paralisa, pois apoia o medo como ferramenta
para essa suposta expiação.
A culpa demonstra insanidade na
medida em que apoia o medo. Quem pode dizer que um homem desenvolve uma parte
de si mesmo através do erro? Apoiando o erro como forma de desenvolvimento? Certamente,
não haverá nenhum problema com isto, pois podem existir “lições aprendidas” com
o erro, mas desde que o erro seja visto como um equívoco, como diz o Livro. Mas
se o erro precisar ser expiado através da culpa, o indivíduo que evoca a culpa
para se expiar através do arrependimento torna-se um perverso torturador de si.
O totalitarismo nascido da culpa
surge mediante uma “propaganda” feita pelo ego, exercida sobre o sujeito da
experiência, diante da qual a culpa tenta provar que ele é uma pessoa totalmente
normal. Explico: o sujeito culpado é visto como qualquer outro no mundo, sofre
das mesmas mazelas e é vítima da sociedade ou daquilo que “lhe acontece”. Ele é
vítima do mundo que vê: a culpa está lá fora, em alguém ou em algum sistema, e
ele apenas se vê como um incapacitado diante da impossibilidade de mudar para
melhor as mentes ou condições externas a ele.
Ou por outra: pode também ver a
si mesmo como o pior diabo de todos, e assim precisa imiscuir no seu proceder
formas diferentes de aceder ao medo, diante de corroborações de erros e faltas
de virtudes morais, éticas ou mesmo a falta de honra diante dos seus pares. Seu
apoio interno a este tipo de desídia lhe traz mais para perto de si mesmo, e o
solipsismo decorrente de tal modo de ver a si mesmo é o isolante social que o
faz ver em todas as pessoas alguém que lhe é melhor, ou mais honrado, ou
moralmente mais valioso etc.
Assim, a culpa surge por dois
tipos de viés: de dentro para fora, quando o sujeito da experiência se vê como
um pobre coitado diante dos outros, segundo sua “nobreza” em perceber a si
mesmo como um pária. Ou de fora para dentro, quando o indivíduo se vê como um cosmopolita
dissolvido na massa, ou um lavrador diante da natureza, ou qualquer outro tipo passível de ser oprimido por
alguma força exterior.
Estes dois modos de ver leva o sujeito da experiência separada a crer que a única maneira de se ler como um indivíduo se dá através da imitação. O Curso diz que no relacionamento especial se busca trocar a si mesmo por alguém de mais valor, mediante a incorporação de um modo melhor de pensar, ou um modo de agir mais condizente com a vida etc: “(...) quando (o ego) acha o relacionamento especial no qual pensa que pode realizar isso, ele se desfaz de si mesmo e tenta se “trocar” pelo ser do outro”.
Estes dois modos de ver leva o sujeito da experiência separada a crer que a única maneira de se ler como um indivíduo se dá através da imitação. O Curso diz que no relacionamento especial se busca trocar a si mesmo por alguém de mais valor, mediante a incorporação de um modo melhor de pensar, ou um modo de agir mais condizente com a vida etc: “(...) quando (o ego) acha o relacionamento especial no qual pensa que pode realizar isso, ele se desfaz de si mesmo e tenta se “trocar” pelo ser do outro”.
Quando a culpa emerge com toda
sua força diante destas fantasias, afirma exatamente o que é a propaganda do “real”
que está por trás de todas as desculpas listadas acima: você é um pecador por
ser como é, e merece punição e morte. Ou mesmo coisas que atestem isso, através
de algum símbolo de mal viver. O sentimento que isto provoca muitas vezes é
escamoteado através de muita procrastinação ou por meio do sentimento de
vitimização, mas sempre surge como um sucedâneo para o medo da vingança que o
erro certamente trará. Se você pensa assim, as coisas se darão assim.
O Curso em Milagres vem em nosso
auxílio para dizer que isso não precisa ser assim. A independência não é
isolamento, tampouco o sentimento de admirar os outros não precisa se destacar
em especialismo. O Curso deixa muito claro que cada um tem uma função aqui que
somente ele pode realizar. O livro diz ainda que és livre para procrastinar, ou
para buscar apenas relacionamentos especiais, baseados no medo de valorizar
suas próprias ideias. No entanto, há um Amigo capaz de remontar ao teu
repertório de pensamentos as ideias que podem desfazer tudo isso.
Esse Amigo é o Espírito Santo. Ele
não pode estar contigo se tu mesmo não permitires. Ele pode ser encontrado em
ti mesmo, dentro de ti mesmo, e também no dentro que vem de teu irmão, quando
vires o teu irmão como o mesmo. Nunca poderás especializar “o mesmo”. Como
seria possível? A natureza do mesmo é o amor que com amor se doa, e depois se
estende, totalmente diferente de como o mundo nos ensinou a completar. O que se
paga no especialismo é a morte. Não a morte mortal, pois a morte não existe, o
corpo é um fiel depositário de um recursto muito limitado a que chamamos ego.
NO todo, no “por dentro” de teu irmão, estamos reunidos não como “uma unidade
partida em muitos”, pois esta é a
definição do sonho. Na verdade, pensemos assim: o homem quando vê o visto,
segundo o filtro dos preconceitos de seus dias, vê ideias que lhe fornecem os
sentidos de seus dias. O Espírito Santo nele também vê o dia, mas não acredita
em matéria e forma, e assim divulga Suas Próprias Ideias para aqueles que se
permitem ver. No entanto, imaginemos um suposto "homem A", que vê suas ideias de acordo com suas experiências. Certamente, tal homem pensa ser diferente do "homem B", que utiliza para si outro filtro ideológico para se ver no mundo. Contudo, se pudéssemos “desfazer” a
personalidade do tal "homem A", que tão diligentemente o próprio "homem A " construiu, e
depois “desfazer” a personalidade do "homem B" que tão diligentemente o próprio "homem B" construiu, os corpos A e B veriam o mundo “puro”,
aparentemente através do “nenhuma personalidade”, mas, realmente, segundo a ótica do mesmo. O mesmo
não é um complexo de ideias que tem seus dias contados. Desfazer isso não traz nenhuma perda.
Obviamente, tais coisas são
vistas como mentiras pelo ego. A culpa demonstra claramente que o valor de todo
o estratagema de se sentir bode expiatório do medo tem valor, e que melhor seria morrer a desfazer o que não existe. No entanto, como uma certeza plena, fica a garantia
de que ninguém pode desfazer a vida, mesmo se um meteoro caísse aqui na terra e
destruísse o planeta. A vida é uma instância imaterial, não precisa de matéria (humana
ou extra-terrestre, se você pensou nisso) para existir. A vida é um “a-priori”
a-priori.
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