terça-feira, 21 de julho de 2015

Sobre a continuidade entre o passado e o futuro


“Lembra-te que a ênfase que ele [o ego] coloca na culpa
lhe permite assegurar a própria continuidade,
fazendo com que o futuro seja como o passado
e assim evitando o presente.”
(Texto: Cap. 13 , IV , 4:3)


               Pergunta: Por que é dito no UCEM que o ego quer que o passado seja igual ao futuro?

               Resposta: porque a experiência do presente para ele é insuportável. Ele quer que o próprio tempo se estenda como um contínuo que não revela nenhuma forma de instante, a não ser que possa ser entendido como um momento em que se tem alguma sensação ou percepção envolvendo o corpo. Sendo desta forma, o tempo será o que ele quer fazer dele, estando preferencialmente atrelado a algum tipo de empenho no sucesso ou fracasso. Certamente, não haverá diferenças entre passado e futuro, pois o que é contínuo não pode conter nenhum intervalo, a não ser que o corpo queira alternar-se como bem ou mal sucedido em relação ao futuro ou ao passado.


               Por outro lado, o instante santo não é um intervalo. Ele não está atrelado à percepção e por conta disso é invariável. Ele é o mesmo, e o futuro aparece no instante santo como o mesmo instante sempre, estendido a partir do presente. Para o ego, há este instante e instantes subsequentes, onde as imagens se sucedem em intervalos regulares a que chamas tempo. No instante santo, o tempo é suprimido em favor da sabedoria, e não é percebido como uma dinâmica que favorece a continuidade das imagens. Por isso se diz que, às vésperas da revelação, um período de certa desorientação pode de fato acontecer. Mas também se diz que não ficarás sem um quadro de referências. O UCEM relembra que sem o ego, tudo seria amor. 

Uma nota sobre vegetarianismo

Há vida na semente


               Pergunta: se tudo o que comemos é vivo, ou foi vivo, como pode o vegetarianismo ser uma condição que preserva a vida?

               Resposta: Jesus comia peixes. Ele também dizia: “o que contamina o homem não é o que entra na boca, mas o que sai da boca, isso é o que contamina o homem.” (Mateus 15:11). Entendemos mal a circunstância da vida neste planeta e, embora classifiquemos a vida em gradações, o seu pressuposto em sofrimento está mais aparente nos animais. Isto não quer dizer que há uma “conduta” na alimentação que “salva”. No entanto, cada vez que se pressupõe um alimento como morte, uma ideia é aderida a este pressupor; e ideias são as bases da constituição do aprendizado. 

               Somente pode se alimentar verdadeiramente quem está fazendo o que faz por vontade própria. Não há pressupostos condicionais ou ideológicos que garantam o corrigir da mente. Se alguém se apropria da carne ou de um bom churrasco enquanto congraça com seus irmãos no amor, bendito seja tal churrasco. Enquanto outros na mesa podem muito bem resistir à ideia de ser carnívoro pressupondo, no entanto, uma conduta alternativa que, baseada numa mentira, pode vir a ser muito prejudicial.


               Tampouco o vegetariano está a “preservar a vida”. O caso é evitar maior sofrimento. Os vegetais são seres sencientes, mas não conscientes. Eles não podem adicionar ao campo das ideias a noção de sofrimento. Por isso dizemos que preservar os animais da dor é uma atmosfera bastante favorável à ideia de sofrimento que produz o afã do comércio alimentício no mundo. No entanto, um vegetariano “forçado” seria ainda um pequeno equívoco neste momento da história, pois ele poderia recusar a compreensão disto e se ater a uma neurose em “fazer” ao invés de “criar” em sua alimentação. Não estamos prontos ainda para uma preservação da vida no planeta como um todoe há muitas pessoas realmente amáveis que se alimentam de carne, pois a noção deste tipo de alimentação ainda vigora como ideia e não pode ser suprimida à força por comportamentos. No entanto, já há para além dos vegetarianos os veganos, fornecendo uma  outra forma de pensar; e para além destes há os que se alimentam de água e luz, somente de luz, e alguns poucos que já se alimentam somente de ideias de alimentação, pois “tudo é uma ideia.” (UCEM, Texto, Cap 5, I, 2:4).   




terça-feira, 21 de abril de 2015

Sobre desconfiar dos próprios motivos




               Pelo bem se vai além, diz-se. Mas, esse tal bem, quem o conhece? Qual categoria de bem é irrevogável? Tu julgas o bem como uma categoria vigente nas proposições nas quais o mundo diz “isto é bom”, mas dá uma olhada para esse mundo sem emoção. Será mesmo que aquilo que o mundo diz que é bom é confiável?

               Perguntas, então, se as pessoas que construíram a “melhoria” do mundo são realmente pessoas boas. Será, por exemplo, que os ‘Médicos sem Fronteiras’ são pessoas que estão a perder tempo? Seria Irmã Dulce uma pessoa que perdeu seu tempo? Então, se não acreditas mesmo nisto, qual será a parte da tua mente que se ilude com o “bem de mundo” como uma falácia em “bem estar” orbitando no umbigo? Queres mesmo saber se há bem no mundo? As pessoas que querem fazer o bem são as melhores pessoas que aparecem para outras.

               Mas não entendem de ser melhores para outras obedecendo a leis exteriores. Elas não estão divulgando a si mesmas em suas ordenanças gentis. Elas nem sabem que são boas. As pessoas realmente boas geralmente nem se entendem assim. Há muito personalismo no bem que se vê bom.

               Aliás, é bom que saibas que o bem, no sentido de um volver em direção à mente certa, dá um trabalho danado! Quase nunca traz o envelope de glória e satisfação que o tolo sonha obter. Vide a vida de Jesus. Mas Jesus era um trabalhador de milagres, o maior que existiu, e decerto que era muito feliz. Somente um homem feliz poderia fazer o que ele cumpriu.

               O que se diz no UCEM é que a parte Dele já foi cumprida e por isso se diz que Jesus Cristo trouxe a salvação do mundo. Não precisamos mais de sacrifícios e mesmo Ele não viu Sua função cumprida como tal. Mas precisamos de espelhos claros do que Ele deixou, em mensagem de salvação, qual seja: "amar ao próximo como a ti mesmo". Entretanto, se tu acreditas que o próximo tem que te amar primeiro, há uma perspectiva invertida em teu pensamento.

               Agora o trocadilho acerca do que foi dito poderia vir à tua mente desta forma: ‘ora, se no UCEM é dito que servir ao Espírito Santo, ou seja, cumprir nossa função, não dá trabalho nenhum, por que então se diz aqui que a felicidade verdadeira e o verdadeiro bem são trabalhosos?’ Na verdade, eles não são trabalhosos em perspectiva verdadeira, do ponto de vista do conhecimento, que não vê diferença em níveis e não classifica. Mas há um empenho verdadeiramente visto como trabalhoso em se fazer, em um mundo de cabeça para baixo, algo de cabeça para cima. Pelo menos, por um tempo, pode ser assim. Mas não é verdade que existem pessoas que cumprem trabalhos exaustivos, mas não percebem tais ações como sendo sacrifícios, posto fazerem aquilo que gostam? Até que possas ouvir uma Única Voz, o teu trabalho em voltar-se para Deus é uma acepção de tua aceitação do mesmo, ou seja, do outro, que ainda vês como diferente. Isso pode ser difícil no começo, como diz a canção. Mas trará novamente a alegria de trabalhares duro, com significado. 

               Se quiseres ser amado, doe amor. Essa é a prerrogativa básica do UCEM. Nunca se sabe quem vai receber amor no estado de amado. Alguém pode estar muito doente. Estes precisam dos trabalhadores de milagres em devoção total. Quem pode se crer bom vendo a miséria em imagens? Ele está se curando, se ajudar. Ele divulga o aprendizado generoso em compreender que amar ao próximo não é ater-se ao que precisa. Nisso, o amor ao próximo configura o perdão. Louvados sejam os irmãos que sabem que a salvação nesse mundo urge!

               Não há duas pessoas aqui. Portanto, podes receber amor se deres amor, pois dás ao mesmo, se não há dois. Na verdade, não é aquilo que dás que configura o teu amor. Podes certamente dar um milhão em moedas de ouro para uma pessoa em condições tais que venhas até mesmo a humilhar tal pessoa. Podes, por outro lado, em um bom dia sincero efetivar uma cura aparentemente impossível. Não é isso que o mundo prega, pois parece que o valor verdadeiro está nas coisas. Os símbolos do ego podem vir até mesmo na forma de um santo generoso!

               [Raul Seixas dizia: “o meu egoísmo é tão egoísta, que o auge do meu egoísmo é querer ajudar”]

               E foi grande a sacada dele. Uma percepção correta em disponibilidade, pois não é a ajuda que configura o amor, mas o contrário. Em um mundo de cabeça para baixo, parece que amar é pagar com amor o amor que se paga. Mas o amor não se troca por si, pois se reconhece no mesmo e apenas se dá. Ele não cobra nem paga. Decerto, para uma pessoa muito orbitada em seu umbigo, às vezes é preciso começar com o aprendizado da ajuda meramente ensinando uma forma de ajudar, como um princípio em reeducar. Isso é o que deveria ser praticado com nossos irmãos nos presídios, por exemplo. Pelo castigo não se reeduca, mas pode-se realmente enfatizar a correção com um exemplo forte. Isto, diante de nosso aprendizado, estará a cargo de quem sabe disponibilizar.

               Finalmente, se teus motivos implicam em desconfiança, lembra donde as boas intenções residem, quando tortas. Para saber se tua intenção é boa, ama ao próximo na tua disponibilidade em intenção. Não é aquilo que fazes que vá dar significado ao amor, mas o amor é simbolizado no que fazes, se fazes com amor. Por isso, não há tamanho nem valor que possa substituir algo dado por uma criança, por exemplo. Muitas das vezes é uma coisa bastante simples, como um desenho, uma flor de mato, um abraço, mas aquilo vem agregado a uma total disponibilidade, e é isso que cura. Às vezes, o amor pode vir em forma de estetoscópio ou numa moto usada. Apenas a culpa indica medo e falta de propósito verdadeiramente generoso. Eis uma regra boa: se fores a doar, despeça-te.


               A caridade — que sabemos ainda ver diferenças em níveis — é, no entanto, um princípio valioso na reeducação. Tu sabes que podes. Vá à prática e não te faltarão ajudantes. Perceberás facilmente o que significa dizer que “Eles Vieram. Eles vieram, afinal.”

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domingo, 22 de março de 2015

Sobre a beleza



A beleza em si não é uma ferramenta do despertar. Ela aparenta harmonizar e estruturar uma obra de arte, por exemplo, em verdadeiros símbolos harmônicos, mas estes podem ou não apontar para o real. Não são garantias da dissolução do pensamento errado. Podem, inclusive, ser mal interpretadas em favor do ego. No entanto, a beleza em si pode ser corretamente compreendida, de acordo com a mente certa, e assim pode ser apreciada como um símbolo da unidade.

Isto foi escrito com a intenção de destacar do contexto da idolatria o fenômeno da beleza, pois a beleza também deve ser compreendida como um nível dentre outros neste mundo separado. A própria necessidade de apreciação da beleza aponta para a necessidade de distinguir entre aquilo que é belo daquilo que não o é. Assim, os níveis são julgados como separados, quando algo precisa ser apontado como belo ou não.

Decerto, tudo que vem de Deus é belo. Mas a beleza neste mundo ainda não pode ser apreciada sem a correta acepção da própria beleza pela consciência. Por outra: uma mente aturdida pode acreditar que o belo está em qualquer lugar, simplesmente porque isto foi dito em alguma teoria sobre arte. Claro que a mente corrigida vê a beleza de Deus em todo lugar, mas a beleza artística, que provê o auxílio, não está determinada em uma única forma de apreciar tudo, como se tudo fosse “o belo” em si.

Há, na verdade, muita feiúra no mundo. Poucas coisas aqui apontam para o belo sem precisão de alguma educação para tal acepção. Mesmo a natureza pode ser obliterada por pensamentos, e o mais belo pôr do sol pode evocar sentimentos melancólicos visivelmente projetados, seja em um amor perdido, seja no cair da noite.

Mas como a beleza pode influenciar a mente certa no sentido de sua educação? Isso é possível? Na verdade, a mente certa é em Deus, ela não precisa ser educada, mas relembrada pela consciência. Portanto, uma obra de arte, como qualquer fenômeno entregue ao Espírito Santo, pode transmitir uma mensagem que te fará lembrar de ti mesmo. Essa mensagem não é exatamente um “recado”, no sentido de algo que seja diretivo, mas uma possibilidade de felicidade implícita no irrevogável sentimento de prazer estético que vigora além do corpo; um êxtase contemplativo, talvez um indício arrebatador, que inclui nisto um fenômeno catártico que o corpo pode perceber.


Tal disponibilidade é favorecida por obras cujo empenho em se dispor para sua feitura ocorreu em consonância com a mente certa, isto é, obras nas quais a disponibilização do artista prevaleceu. Muitas destas obras não são compreendidas à altura da vida do artista, ou não podem ser reconhecidas de imediato, pois o próprio artista pode não estar em condições de responder por elas. Embora tenha disponibilidade para a realização da obra, ele mesmo teme a mente certa, e projeta a beleza que está nele “para fora”, numa “obra de arte”, e muitas vezes o artista é tido como excêntrico, ou misantropo. Isto porque o medo pode ser muito grande em certos tipos de artistas, mesmo os de grande talento, para quem o anonimato é preferível e isto realmente pode favorecer bastante sua caminhada.

Em outros dos tantos casos possíveis, um artista pode ter consciência que sua arte faz parte de sua caminhada, isto é, que sua arte é parte de sua função aqui. Neste caso, desde que ele não esteja iludido nisto, sua obra será apreciada e o próprio Espírito Santo poderá auxiliá-lo no sentido de ele poder responder por sua obra.

Talvez, em um sentido mais amplo, a beleza artística, bem como a beleza que há nos atos do mundo, ou em seus panoramas e paisagens, não seja de todo um fenômeno “de valor”. Aprendemos que não existem escalas ou graus de ilusão. Não adianta “trazer uma ilusão a outra” para tentar resolver o conflito da existência. Em outras palavras, a idolatria da arte também não pode te salvar, embora ela seja sobrevalorizada neste mundo pelo seu claro valor de disponibilização. Há muitas obras de arte que foram realizadas em consonância direta com a mente certa. Mesmo assim, enquanto ainda forem compreendidas como coisas separadas, não podem atestar o mesmo, embora possam favorecer caminhos simbólicos favoráveis. Insisto, porém, no seguinte: mesmo a mais bela obra de arte realizada neste mundo, ainda é como uma parte desorganizada do todo que procurou simbolizar — na beleza ou verdade que contém — um segmento destacado daquilo que o Livro Texto diz ser “a capacidade da memória em lembrar o agora”; ou ainda um simples recordar daquilo que é realmente bom. A verdadeira obra de arte é sempre compreendida, não precisa ser explicada.

Mas a beleza, neste contexto, pode ser como qualquer outra coisa que é disponibilizada para o Espírito Santo. Isto precisa ser dito em favor da sanidade, pois a idolatria envolve muito medo em acontecer um evento favorável, e pode querer encontrar caminhos nos quais a disponibilidade estaria “garantida”.

A única garantia favorável ao despertar é estar em disponibilidade ao Espírito Santo. É ser sem defesas, é aceitar a Sua Voz como a de um verdadeiro Amigo, é amar como sendo o mesmo amor, sem apreciar ou desdenhar, pois o amor não julga. A beleza estará sempre presente nestas coisas, estejam elas desempenhando em obras de arte ou em abstrato, conforme é sua real natureza, da qual a obra de arte, bem como qualquer coisa separada, não faz parte, embora possa compreender desta linguagem.

Por fim, a beleza não está neste mundo. Ele surge aqui como símbolo e vigora em volatização, pois bem sabes que a apreciação de uma obra de arte, ou as sensações evocadas por ela, estão condicionadas a uma série de fatores mutáveis, mas a verdade é eterna. Um pode passar por uma ópera sendo executada no saguão do metrô e nem se dar conta, e outro pode ter uma arrebatação. Neste caso, a disponibilidade para perceber a beleza foi o fator preponderante. Mas se todo o dia tal fato ocorresse, poderia haver o caso de o artista tornar-se indisposto.

A arte universal demanda atributos universalizantes. O que achamos verdadeiramente bom é boa arte.