O
sono ao qual chamas vida parece variar continuamente de acordo com suas baixas
e altas em expectativas. Deveras, aquele que não tem expectativas não pode se
alterar em digressões e esperanças de mudanças. A vicissitude surge em um
contexto de investimento em escassez. Somente o oposto da escassez, que é a
volúpia ( a eternidade não cumpre opostos ), poderia admitir uma associação entre o que se diz verdadeiro e o que é
ilustração. O amor é invariável. Seria impossível que a variação conformasse em
si mesma qualquer tipo de glória ou divulgação de ameaças, pois seu pressuposto
é a mudança, e não ater a classificação a um único estado. A vida em sonho é
sempre digressiva.
No
caso do sonho noturno, o que ocorre é uma generalização dos pressupostos da
variação em acordo com o tempo. Obviamente, o tempo pode ser “suprimido” ou alterado
durante o sonho noturno, conforme o sabemos. Quando o sonho noturno e o sonho
diurno buscam “competir” pela realidade do sonhador, há um conflito geralmente
estabelecido pela insônia ou inquietude durante o sono, pois nenhum destes dois
estados parece “agradar” ao sonhador. O alto grau de hipnotismo não parece
favorecer seu estado de atenção, e aquele sonho que melhor o seduzir, vence.
Um
pode sonhar que naquilo a que chama vida, há uma torneira pingando, ou uma
cigarra em estrídulo, o impedindo de dormir. Este sonho configura sua escassez
em sono e comprova sua des-espiritualização em fadiga. Por outro lado, o sonho
noturno ao qual consegue se entregar, “comprova” em imagens de terror que o
sonhador do sonho é uma mente aturdida, e que não há escapatória para ele, pois
as imagens que surgem neste contexto atribuem a si mesmo um débito em relação
ao cotidiano do sonhador, e aparentam ser mensagens que “não o deixam dormir”.
Obviamente,
tal estado ocorre mediante uma grande devastação, ou cisão, na qual o sonhador
prefere alternar seu estado consciente entre sonhos, para divulgar sua fadiga
em termos experimentáveis. Na verdade, o sonhador não quer dormir, pois ele
precisa divulgar que o sono é necessário e lhe falta, tanto que seu corpo em
escassez admite o cansaço, e todos os atributos do corpo parecerão falhar, pois
ele teve uma noite ruim.
No
entanto, não é possível que se peça ao separado para sonhar com estas coisas em
sua consciência. Ele não pode sabê-las. Seu total alheamento em relação aos pressupostos
do despertar é tão inconsciente que somente através de uma revelação da
verdadeira natureza do corpo ele poderia entender sobre o cansaço físico. No
entanto, e adicionalmente, o homem que vê a si mesmo como corpo precisará de
descanso, pois tal investimento demanda muito gasto em energia.
A
noite vem para estabelecer — como oposto — a denúncia acerca daquilo que foi
vivido — através de opostos — durante o dia. O sono passa a ser o oposto da vigília,
e o pressuposto desta em “descanso”. O sono noturno são teus pensamentos em
imagens, não formatados pelo tempo, em variáveis sucessivas e diferenciações de
conceitos. Não temes os absurdos do sonho noturno, pois criastes regras para
dizer a ti mesmo que durante a noite “é assim”.
Quando
não consegues adormecer, significa que estás fadigado em fadiga. Algo
semelhante em apropriação ao próprio cansaço em estar cansado. Parece um
absurdo? Pois é para se rir mesmo, conforme a separação só engendre absurdos. O
ego, em cansaço, pede ao corpo, em cansaço, que descanse em sono, enquanto ele
mesmo — o ego — satisfaz a si em autômatos de sonho em vigília. No entanto,
para isso acontecer, o corpo precisa estar acordado, e se o ego quer sempre “mais”,
não podes dormir enquanto ele continuar a “fazer”. O empenho do ego em gerir
conceitos em imagens é interminável, mas durante o sonho noturno, seu
predomínio pode ser obliterado por um que esteja em vias de despertar. Assim,
esta estratégia em insônia visa confundir o sonhador entre sonhos, e dificultar
a percepção da ilusão de ambos os estados. Tanto o sonho noturno quanto o sonho
em vigília são irreais. A alternância entre estes dois estados em várias vezes
durante uma mesma noite pode ser entendida como o empenho do ego em demonstrar
que somente podes acordar de um sonho para cair em outro.
Isso
não é assim. A ocorrência da insônia pode ser curada meramente entregando o teu
sono em confiança ao Espírito Santo. Como se faz isso? É muito simples: quando
fores dormir, lembre com amor de uma situação na qual o dia “te forneceu” amor.
Isto fará com que te lembres de ti mesmo amável. Tenta lembrar-se de como és
amável. Busca, depois, livrar-se da imagem que suscitou tal pensamento, e te
entrega unicamente à sensação. Isto fornecerá para ti uma compreensão do corpo
como um instrumento de aprendizado para o amor. Não é uma libertação, pois as
sensações são percepções; mas é um empenho em direção à cura do corpo como
autômato em jogo de sonhos. Ao chegar a este estado, que já sabes como
experimentar, pede ao Espírito Santo que vele pelo teu sono, enquanto ainda
dormes. Ele compreenderá isso como tua disponibilidade, e não falhará em admitir
para si um indulto para conciliar o sono noturno com teu empenho em despertar.
Na
verdade, “dormir direito” é uma expressão contraditória, pois ninguém pode verdadeiramente
dormir. Apenas o sonho em “dormir” assume para o sonhador a possibilidade de
encontrar no sonho noturno um oposto à vida real. Tudo lá pode ser obliterado,
variado, ressignificado enfim, qualquer empenho em gerar salvação através de um
oposto pelo mesmo, causa uma diferenciação neste “mesmo” fabricado. Explicando
novamente: o sonho noturno não pode repetir a vigília, assim como as imagens da
fantasia não antecipam o evento fantasiado. Sonhar é reproduzir fantasias, e
fantasiar é sonhar reproduções.
Se
não consegues dormir direito, és agora alguém que pode definir a si mesmo como “aquele
que não consegue dormir direito”, e isso é uma limitação. Tampouco podes
definir teu sono sem definir a ti mesmo em auto-julgamento. Como farás então a
diferenciação? Apenas encontrando o meio termo entre o que é dormir e o que é
realmente descanso. O descanso real está em dormir sossegadamente, não em matérias
de impulso ao sono do sono. Dormir bem é apenas dormir, e nada mais. Se
quiseres não te inquietar à noite, procura devotar teu dia aos encontros santos
e aos instantes santos. Na medida em que aprenderes a ter apenas isso, teu sono
noturno será também um sono santificado.
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