domingo, 29 de maio de 2011

UCEM - Expiação.




“Tu tens um papel na Expiação que eu ditar-te-ei. Pergunta a mim quais os milagres que deves apresentar.” (UCEM. Cap. I ; III - § 4)

“Eu estou a cargo do processo da Expiação que empreendi começar. Quando ofereces um milagre a qualquer um dos meus irmãos, tu o fazes para ti mesmo e para mim. A razão pela qual vens antes de mim é que eu não necessito de milagres para a minha própria Expiação, mas estou no final no caso de falhares temporariamente.” (UCEM. Cap. I ; III - §1)


Pergunta: O que é a Expiação?

Jesus Cristo foi um homem que soube o que significa entregar-se. Quando Lhe foi dito o que fazer, Ele simplesmente cumpriu. Um homem não se perde ao ver o que lhe evoca o espírito. Jesus esteve altamente concentrado e se voltou ao Céu como quesito único de sua vida. Ele soube ouvir e obedecer, e, ao que ouviu, divulgou; e, divulgado, recebeu. Portanto, se divulgares a vida, receberás vida. 

Jesus não julgava ninguém, pois sabia da natureza única do homem. Sabia que Deus buscava apenas se conectar com um, pois deste Um salvaria a todos. Este Um, por conta mesmo da extensão praticada por Jesus Cristo, agora são todos. Assim, diz-se que o despertar não é uma conquista, mas uma herança. 

Jesus Cristo é teu irmão mais velho, que fez de si mesmo a Expiação. Ele tem em ti uma confiança perfeita, pois Ele sabe Quem És. Ele permanece atento a tua mais mínima disposição em aceitar a verdade, mas não deixa desamparado nenhum de seus irmãos, que são como Ele e a quem Ele decidiu ajudar a salvar-se lembrando-os disto. Jesus Cristo é a natureza divina em recursos humanos, pois Deus por Si Mesmo não se apodera de nenhum efeito ilusório da separação. Jesus atingiu a sabedoria da Expiação por ter experienciado este mundo em termos de corpo, com o máximo de proveito que é possível alcançar naquele instrumento de aprendizado.  Assim, pode compor a Expiação em Criação, pois estendeu o próprio Reino a este mundo através de seu aparente existir entre nós, sua vida e sua ressurreição. 

A Expiação será a tua porta de entrada no Reino. Atinge-a aquele que perdoa verdadeiramente seu mesmo si que está advogando sua aprendizagem sob outro ponto de vista, noutro instrumento de aprendizado, em outro corpo, isto é, teu irmão.  Sede grato quando vires qualquer dos teus irmãos feliz, pois é para ti também que ele se esforça, embora muitos não estejam conscientes disto. A generosidade de todos, que é apenas fazer o que se tem que fazer, por vezes é confundida pelo ego como a arrogância. O ego diz que se tu tiveres confiança no teu irmão, estarás perdendo alguma coisa que teu irmão tomará de ti. Assim, se teu irmão está feliz, você deve ficar infeliz, pois ele tomou uma parte da felicidade do mundo que era para ser tua. Isto é loucura! A alegria está disponível na Expiação com a qualidade do infinito. E aumenta à medida em que é partilhada. Por isso se diz que a alegria é o primeiro passo para a Expiação. No entanto, a alegria não é um êxtase contínuo de sorrisos e movimentos alargados. Pode ser apenas um calmo sentir a Deus enquanto se pratica alguma atividade trabalhosa. Alegria é estar em paz, não estar sorrindo, embora o sorriso seja o mais bonito dos atributos da Expiação estendidos através do corpo.

Em última instância, expiar é perdoar. A alma que perdoa outra alma está unida àquela, pois reconhece que são uma só. Isto requer certo preparo e os exercícios do UCEM são uma alternativa valiosa neste sentido.  Perdoar é não ver nada no outro. Perdoar é estar cego ao ódio, surdo ao desamor e oco de todo o julgamento — e oco é o vazio. Perdoar é amar sem nenhum resquício de ego. Perdoar é apenas ver o que se vê, pois o corpo do teu irmão é uma metáfora do que ele é, ou seja, é uma mera imagem. Condenar a imagem é uma figuração do erro em não distinguir o que é verdadeiro. Por isso, condenar a imagem é como querer "fazer uma realidade" em figuras de ódio e dar ao ódio status de algo que acontece.

O milagre é um desfazer, pois o "fazer" é querer construir à força um propósito impróprio. Criar é estender, libertar, soltar; conceitos que são  contrários à noção de julgamento, cujo propósito é manter — manter uma ideia, um juízo ou um conceito de alguém. Lembremos disto: os corpos estão separados, mas não sou um corpo, bem como meu irmão não é um corpo; então, na verdade, não podemos ser separados. Se julgo, e não estou separado, julgo apenas a imagem projetada de mim mesmo. 

Pedimos aqui a Deus que saibamos aprender a perdoar. E vimos agora a Ti, Espírito Santo, dizer que estamos abertos para que nos aponte o caminho dos milagres que nos conduzirão à Expiação. Peço por mim, para ti, por todos meus irmãos, meus iguais, amém.


Obrigado por leres até aqui. És bem vindo aqui. Te amo.


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sábado, 28 de maio de 2011

UCEM - Sobre a natureza inclassificável do perdão.

Obrigado a ti!




O perdão é um aceite da alma. Uma condição na qual não se vê nada além do visto. A comum reação acerca do perdão, isto é, a forma como o perdão é lido pela maioria das pessoas, está ligada a um entendimento de barganha. Ocorre quando se vê o pecado no outro e depois se perdoa isto. Funciona assim: alguém te xinga, por exemplo, e você diz: tudo bem, ele me xingou, mas eu não vejo nisso pecado, pois eu sou um estudante do Curso em Milagres, então perdoarei, e assim comete-se o erro do orgulho escamoteado em auto conceito. O conceito que se atribui a si mesmo em casos como este está devotado ao princípio vaidoso de se acreditar melhor que o outro. Assim, julga-se para depois perdoar. Outro exemplo: digamos que meu carro estivesse limpo, então eu sujasse o carro para depois lavá-lo, e ao final dissesse: agora sim! Fui eu quem limpou! Ora, assim há engano e barganha, na medida em que se troca a limpeza por mais um conceito, um trabalho inútil, que concebe ao indivíduo a tarja de ser um homem, digamos, higiênico, ou cuidadoso. Isso não vale de nada, é só mais de verniz. Não adianta tu olhares teu próximo com ódio para depois perdoar, somente com o intuito de convencer a ti mesmo que foste tu quem lavaste a alma de teu irmão, que já está limpa. Contudo, se tu ainda não és capaz de distinguir bem o amor de outra coisa, que é o pedido de ajuda, precisas limpar tudo o que vês, mas esse tipo de limpeza em que tu mesmo sujas o que limpas não é nada, de nada adianta, a não ser trazer para ti trabalho desnecessário e a condição geralmente dolorosa de rebaixares a ti mesmo à condição de gari do teu ego.  

Ver o visto — eis tudo! Ver o visto é estar com o olhar devotado ao instante. O instante é um conceito, como o “agora”, ou o “momento este”.  Não pode ser dito de outra forma e a linguagem aqui é mero acessório. No Reino, a maior poesia é fala comum, é uma gíria, uma linguagem desnecessária. Tudo é entendido no instante mesmo que é, pois não se atém a conceitos: o Reino — É. Obviamente, pedir a ti que estendas o Reino através das palavras é tarefa fadada ao fracasso por conta da limitação da língua, de qualquer língua. Contudo, a linguagem faz às vezes de vetor, e se considerares isso, expressões como “momento este”, “ver o visto” ou “agora” cumprem funções de tabuletas. Assim, o homem do letreiro, que indica alguma coisa, és também tu.

Encontrarás muitos irmãos que escrevem letreiros com outras coisas, como flores; ou música, ou trabalho, ou exemplo de si, com qualquer coisa que se possa usar para colocar na tabuleta a inscrição “vai-se por aqui”. Tu que lês, também tens teu talento, e sobre isso se escreverá em outra ocasião.

Perdoar, contudo, é a função que promove a verdadeira linguagem, que é a linguagem da verdadeira limpeza. Perdoar é não ver sujeira em lugar algum. O perdoado não é aquele que limpou os outros, mas aquele que não viu o sujo jamais. Por isso se diz que não podes dar o perdão através das palavras. Se alguém chegar a ti pedindo um conselho, tu não diz algo que direcione, pois não há caminhos consignados. Não podes dar a ninguém uma ilusão, pois o que dás, recebes, e se dás a um irmão a ilusão do caminho, no mesmo momento recebes ilusão, e se configura um não existir em intervalos. Contudo, se apenas entrega ao teu irmão o teu visto, o teu olhar que é, o teu estar em si, apenas vês o que ele é ali contigo, e não julgas o nenhum valor, então tu és santificado, e perdoas com o caráter verdadeiro do amor, que é o respeito. O respeito é não-interferência. Realmente, neste mundo, em algumas ocasiões um irmão pode estar menos desperto, então ofereces o milagre a este irmão. Em outros momentos, és tu quem o recebe, mas não há configuração de valores nisto.  Às vezes, este milagre pode estar escondido numa forma, mas a forma não importa para além do conteúdo. Para tanto, tem uma história:

Certo dia, eu vinha do mercado em meu carro e estava em um dia bom, desses de mente certa. Parei no semáforo e se aproximou de mim uma mulher mendiga. Estava maltrapilha em toda sua forma de magreza, quiçá de crack, ou estrago de fomes, ou qualquer outra destas coisas que o abandono provê em sua judiaria de rua. A mulher veio com um sorriso construído, que denunciava a mentira de precisão em medicamentos. Isso eu soube pelo ato da imagem. Digamos que não fosse assim, mas naquele momento eu julguei assim. E, por julgar, classifiquei a mulher como está descrito acima, e o espírito dela agora chega até você como uma imagem passível de tantas misérias. Mas peço-te a paciência de seguir as palavras até que elas completem seu sentido. Resolvi, então, que não ia dar esmola coisa nenhuma. Essa seria a maneira de ajudar que entendi ali, isto é, não fomentar a mendicância. Assim, eu poderia “lavar” a mulher. Este foi o entendimento errado que tive. No entanto, como se fosse um arrebatamento de mim, como se eu pudesse ser movido, minha mão alcançou o cinzeiro do carro, onde estavam depositadas algumas moedas, e então vi a mulher mendiga e soube que ela era espírito, como se ela fosse um “ser crustáceo”, no dizer de Guimarães Rosa. Não julguei, apenas soube, e como soube, como tive certeza disto, eu não sei dizer, pois não foi um saber de natureza descritiva, como da mulher mendiga que vi e julguei, mas era como se agora eu visse uma Rainha, a Mãe dos Homens, a sensação de estar diante do próprio ser feminino em suas formas de belezas sobrenaturais, elevadas pelo que era amor em termos de sentir o outro como sendo o mesmo, e sobre isto eu não sei dizer mais. Então, entreguei-lhe as moedas, olhei no olho daqueles olhos, e disse: eis aqui, Senhora; e a mulher por um instante era digna e estava em si, e me ajudava a estar ciente disto. Então ela colheu as moedas e me disse um obrigado que era como se fosse o agradecer de iguais, e depois disto olhou para o lado e estava em ternas lágrimas. Embora ela estivesse agora de perfil, eu ainda via seus brilhos olhos, e, olhando ainda para o lado, ela repetiu: obrigada, moço. E se foi.

Não posso interpretar esta história por ti. Peço, no entanto, que não a julgues, que a perdoe, e talvez assim ela ganhe algum significado para ti.

Obrigado por leres até aqui. És bem vindo aqui. Te amo.

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terça-feira, 17 de maio de 2011

UCEM - Sobre a alma

Obrigado a ti

A depressão é uma ocorrência no corpo. Advém de conflitos da vontade e de suas conseqüentes incongruências. O principal destes conflitos reside em sua forma arquetípica na conexão entre espírito e corpo, mediados pela alma. A alma é mais pessoal que o espírito. Por isso se diz que uma pessoa cruel está “desalmada”, e por isso se quer dizer que este comportamento é baseado unicamente nos anseios do corpo, subsidiado pelo entender insano do ego. Cada criatura está em consonância com o universo inteiro, com o próprio andamento das coisas, e este é o modo de ser do reino da percepção. Mas a criatura, enquanto experimenta apenas as coisas deste mundo, não se percebe como ente e espírito. A alma, portanto, cumpre uma função identitária. Por conta deste caráter identitário, pode-se falar em “noite escura da alma”, “dor da alma”, e outras expressões como estas, pois o espírito não sente dor nem anoitece. A depressão surge, portanto, de uma perspectiva equivocada da alma. A alma não perde jamais o contato com o espírito. Ela é a parte do Filho de Deus que está em contato com o Espírito Santo e que particiona de sua qualidade existencial. A alma é menos densa que o corpo e mais densa que o espírito. Por conta disso, a alma pode se libertar do corpo com muita facilidade e aproximar-se do espírito. Existem no meio de nós muitas inconstâncias de humor que são sustentadas por ‘estados da alma’. Por conta desse argumento, podemos aceitar que a alma é variável, e acreditar que não vem de Deus, pois tudo o que Ele criou é imutável e a alma varia. Este raciocínio não está incorreto, mas precisa de um complemento. A alma, estando muito próxima ao corpo, surge como um oposto ao ego. Assim, como oposto, pode-se dizer que a alma é o mais próximo do que se pode chamar de um “ego espiritualizado”, mas esta expressão não é adequada, pois ela admite uma contradição nos seus termos. Esta ideia apenas foi introduzida para mostrar o caráter de oposição que há entre a alma e o ego. Assim, a alma é a uma tendência ainda perceptível do espírito, isto é, ainda convivendo em termos do mundo, mas não inteiramente desapropriada dos efeitos atordoantes da mente, como o espírito, que está isento destas variações. A alma pura, conforme se entende o termo aqui, seria o equivalente no Curso à mente certa. A mente certa não admite ‘noite escura’ em si. Já a alma escura, seria equivalente à mente errada. Note-se, portanto, que a alma é bem diferente do ego, mas escolhe se aliar a este ou ao espírito. Quando escolhe o ego, escolher anoitecer. Assim, surge um senso de sofrimento que é a própria depressão.
O espírito é imortal e está consciente disso. A alma também compartilha da imortalidade, mas precisa da ciência disto. Quando a alma certifica-se pela escolha certa, a alma e o espírito tornam-se um só. Por conta desta natureza, estes conceitos (alma, espírito) são bastante aproximados na linguagem comum, mas há o inverso disto, que é a capacidade de confundi-los. O espírito não está neste mundo como um corpo. A alma (mente) pensa que está neste mundo como corpo até fazer a escolha certa e lembrar-se do espírito. O corpo é o instrumento de aprendizado da alma. Eis tudo, pelo certo. A depressão é tão ilusória quanto o meio que utiliza, que são as formas. O meio de escapar à depressão é estar com a alma purificada, isto é, estar na mente certa. Assim, o empenho nos exercícios se dá pela sua pragmática, e não pela mera filosofia em êxtases de bom conhecedor. Quem bem conhece, bem compartilha. Eis a cura de toda depressão. Assim, pedimos a Deus que nos ajude a perceber corretamente toda ocorrência de julgamento errado. Que saibamos ver os obstáculos no sentido etimológico da palavra, que é o de resistência. Que não usemos o mundo para resistir e assim dar existência aos obstáculos e aos seus correlatos: o passado e o futuro, pois resistir é descrer. Os obstáculos são simplesmente símbolos de nossa falta de fé. O resultado é a depressão. Contudo, tudo nos é dado. Somos felizes pela condição de estar em casa. O tempo já se foi, e todos podemos se ajudar mutuamente, curando. Pedimos agora a Deus que percebamos em nós as condições da cura, amém.


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domingo, 15 de maio de 2011

UCEM - O Ponto Aton





"Estás por demais preso à forma e não ao conteúdo." (UCEM - Cap. XIV - § 7)


Este vídeo, no futuro, será compreendido com clareza, pois seu discurso é consistente. Apenas aparenta ser empolado e labiríntico por conta de seu caráter altamente simbólico. Realmente, a mensagem atrelada à fala da garota é derivável de uma concepção apenas passível de ser compreendida neste momento da história com o apoio de uma lógica baseada em simbolismos.

Para tanto, tentaremos aqui uma aproximação daquilo que nos parece ser o conteúdo significativo da mensagem. Indicações disto podem ser percebidas logo no início do vídeo, quando a garota diz que vai “chorar”, isto é, protestar, por não poder prever seu futuro “além do ponto final se tornando uma outra língua brasileira”. E, assim, entendemos que o discurso emitido acede às limitações da língua. Somente através de uma outra língua brasileira, através de outro código, talvez fosse possível emitir tal mensagem neste momento da história com clareza.

         Estamos diante de uma daquelas mensagens caracterizadas por um “quem tiver ouvidos para ouvir, ouça”. Vejamos: o tema do discurso da garota é o Ponto Aton. Pois bem: Aton era o nome dado pelo faraó egípcio Akhenaton a um Deus único, simbolizado pelo sol. Akhenaton procurou substituir a cultura politeísta egípcia que cultivava vários deuses, como Amon, Ísis, Thoth e Rá. O faraó argumentava em favor da Unidade, e esta é a primeira ocorrência histórica de uma tentativa de se estabelecer um Deus único em uma cultura.[1]
No ano 1353 a.C., Akhenaton proferia suas orações já nestes termos:

“Ó Aton vivo, princípio da vida (...) Ó Deus único, sem par! (...) Criais a Terra conforme vosso desejo(...) Estais em meu coração e ninguém além de vosso filho Vos conhece”.

Dizer que “o futuro pertence ao Ponto Aton” é o mesmo que afirmar que todos nós estamos indo ao encontro da Unidade, da consciência do Ponto Aton, isto é, caminhamos rumo a um ponto em que o Deus único (Pai) será conhecido pelo Seu Filho (Consciência do Pai). Por conta disso, se diz no vídeo que "nosso futuro é muito reluzente".
Outro ponto levantado pelo discurso no vídeos são as inferências às réplicas e tréplicas.

 É dito pela garota que “as réplicas são constantes”. Depois desta advertência, a garota prossegue e diz que “no futuro, a gente pira. Não vai ter mais a que se reportar. Então, as réplicas, elas são constantes”. Poderíamos dizer que "as réplicas de Deus", ou as imagens de nós mesmos em corpos, elas são constantes, ou seja, são todas "a mesma". Somos todos irmanados na mesma natureza, mas como "réplicas" estamos voluntariamente sujeitos a uma aparência de separação. Por isso é dito que “você não pode adequar que a sua réplica um dia foi uma inocência, né?”, e por isso se quer dizer que a inocência deste fato seria não estar consciente da própria unidade, agindo como um "inocente" ou "ingênuo", isento de qualquer responsabilidade em perceber a unidade. Dizer que a imagem que criaste é inocente é o mesmo que dizer que o corpo — ou o ego — é inocente. E você não pode mesmo “adequar que a sua réplica um dia foi uma inocência”.
Por outra: a réplica da Unidade são os corpos. Não há uma categoria passível de unidade nos corpos e, portanto, a réplica à Unidade foi a separação. Não há inocência nisso. Você não pode adequar sua réplica (corpo) a uma inocência (inconsciência do caráter unitário da mente). Aqueles que não alegam "inocência" (inconsciência), serão os treplicantes: “os treplicantes vão ser aquelas crianças que vão defender o futuro Aton”. 

Tréplica é uma resposta dada a uma réplica. Uma réplica de Deus, de Seu Filho, reduzida a uma imagem, é um corpo. Treplicar seria, portanto, o mesmo que "estar em si", advogando pelo retorno ao conhecimento, ao seguro apoio de Deus. Aqueles que possuem o “seguro apoio de Deus” serão os treplicantes, os que deram uma resposta às limitações do corpo, e são as crianças (conscientes) que defenderão o futuro Aton.
A garota prossegue: “Ai eu vou explicar o porquê [de] Aton: você nunca sabe de onde vem a morte. Às vezes, você pode estar numa cozinha junto com um cara, e achar que aquele lugar não existe mais, porque você não pode voltar; mas esse lugar existe, ninguém vai derrubá-lo. Então você nunca sabe de onde vem a morte.
Agora entramos em uma relação entre o futuro e a morte. O tempo já se foi, conforme sabemos pelo Curso. Então, as coisas que acontecem no tempo são ilusões aparentemente estáveis, que se configuram diferentes apenas pela ilusão de mudança nas formas. Isto é quase impossível de explicar.  Quando vemos a hora no relógio, por exemplo, estamos contando a mudança da forma do ponteiro, mas não estamos prosseguindo junto com o ponteiro, pois de onde nós realmente estamos o tempo não existe. Por que então ‘vemos’ a ilusão de movimento do ponteiro do relógio, e por que esse movimento ‘conta’ o tempo?  Porque o andamento da mudança das formas permite que o ponteiro mude de lugar, e a regularidade disto adverte um ritmo, o próprio ritmo da separação, que é o tempo. Mas a Unidade é coesa, não pode mudar, então não há em Si uma variação. Portanto, todos os lugares no tempo, ou seja, na separação, estão apenas demonstrando uma ilusão, um estado invariável de imagens que se sucedem. Se você estiver num lugar, “numa cozinha junto com um cara”, como no caso da garota, pode achar que aquele lugar não existe mais agora, hoje, depois de já ter passado o suposto encontro, mas esse lugar, no tempo, existe, ninguém vai derrubá-lo, pois todo o passado e todo o futuro estão ocorrendo agora, no momento este. O fluxo da vida advoga pela ocorrência simultânea de uma percepção certa e do conhecimento, cujo caráter não pode ser explicado. Essas duas ocorrências se encontram no tempo através de Deus, que as aparelha com Seus Dons e atribui ao tempo um caráter delusório, e isto é mesmo uma revelação. Contudo, tentaremos uma imagem poética para alcançar dizer o que significa não saber de onde vem a morte.
A morte é um evento no tempo, portanto, assim como o próprio tempo, é uma ilusão. O caráter unitário da vida não permite haver a morte do Filho de Deus, pois a unidade da Filiação garante que haja sempre ‘réplicas’ constantes. Essa unidade da Filiação não pode ser quebrada por algo que ocorre no tempo, pois o tempo é a sequência das imagens percebidas na matéria, portanto, não faz parte do conhecimento, isto é, da realidade. Se todos os olhos dos habitantes do mundo olhassem ao mesmo tempo em conjunto, ou seja, sendo todos uma só consciência, o que surgiria seria a imagem completa do mundo, uma quadrimensão da mente de Deus.  Nesta dimensão, o todo seria imagético, mas não perceptível, pois a imagem estaria configurada no todo, e não nas partes. Assim, se um destes olhos de corpo viesse a parar de emitir suas informações de vista, o tempo permaneceria estável em sua ilusão, pois a imagem que ele deixaria de emitir seria apenas a imagem que era percebida por ele. Contudo, ninguém pode “derrubar” uma imagem que o Filho de Deus percebeu, pois o tempo é todo o tempo no agora. Por isso se diz que um ato corrigido do Filho de Deus no presente modifica tanto o passado quanto o futuro, desfazendo aquele para liberar este. Portanto, pode-se dizer que não se sabe de onde vem a morte, pois ela não vem do ‘fim das coisas’, isto é, do fim da percepção. Na verdade, a morte não existe, ninguém vai “derrubar” as criações dos Filhos de Deus.
Entretanto, “o futuro reside em relutar”. E por isso se quer dizer que a presentificação do passado é o seu desfazer, e que relutar, isto é, resistir ao que é, resistir ao conhecimento é o mesmo que produzir futuro.  O 13º princípio dos milagres diz: “Milagres são tanto princípios como fins, e assim alteram a ordem temporal. São sempre afirmações de renascimento, que parecem retroceder mas realmente avançam. Eles desfazem o passado no presente e assim liberam o futuro”. O desfazer passa a ser uma recordação imediata da memória intemporal da Unidade, e assim o futuro reside em relutar, em manter-se em contato, pois o inconsciente será liberado do tempo por conta disto. Caso contrário, o passado determinará o futuro sob os auspícios da projeção.
E a conclusão é que o futuro reside “em fazer uma revolução interna e conduzir até as urnas todo esse sacolejo dos anos que vem”. E se o tempo todo já existe, é necessária a revolução interna — a cura — e conduzir todo o ‘sacolejo’, todos os eventos dos anos que virão, até o abandono do corpo, às urnas. Isso estendido a toda Filiação significa que a cura terá ainda um espaçamento no tempo para ocorrer, uma espécie de arranjo teleológico que aponta para uma unidade inevitável, que será reluzente neste futuro o qual temos que aguentar de si o sacolejo, os eventos densos desta ilusão de corpo.
Contudo, por enquanto, há a “decadência”; e por conta disso “digo nada”.

                Assim, a mensagem da garota pode ser “traduzida” da seguinte maneira:

“— Olha, eu queria “chorar” porque eu não tenho — assim — a condição de prever o meu futuro além do “ponto final” se tornando uma Outra Língua Brasileira.
Quero lamentar a inexistência de uma linguagem suficiente para exprimir condições argumentativas ideais sobre o futuro.
“Porque eu acho que o futuro a Deus pertence — e Aton — então o futuro pertence ao Ponto Aton. Porque eu acho que o nosso futuro é muito reluzente.
O futuro pertence à Unidade, e por conta disso é bastante promissor.
“No futuro, a gente pira. Não vai ter mais a que se reportar. Então, as réplicas, elas são constantes. Você não pode adequar[2] que a sua réplica um dia foi uma inocência, né? Então, os treplicantes são aquelas crianças que vão defender o futuro Aton.
No futuro, não há referentes, todos os seres serão irmãos em UM, ou numa única mente. Embora constantes na Unidade, todos serão replicados na tentativa enganosa do ego em adequar a inocência através de seus meios, contudo serão também treplicados pelo retorno ao alcance do conhecimento. Ninguém alegará desconhecimento disto. Assim, no futuro, todos defenderão a Unidade.
“Ai eu vou explicar o porquê [de] Aton: você nunca sabe de onde vem a morte. Às vezes você pode estar numa cozinha junto com um cara, e achar que aquele lugar não existe mais, porque você não pode voltar; mas esse lugar existe, ninguém vai derrubá-lo. Então você nunca sabe de onde vem a morte.
A morte não existe. As imagens "perceptíveis" são recorrências do instante que existe, ou seja, o “momento este”, o agora. O passado é desfeito na conscientização de que ninguém pode derrubar o intemporal agora, nem as imagens criadas nele, pois ninguém vai derrubar a consciência da Filiação.
O futuro reside em relutar. Em fazer uma revolução interna e conduzir até as urnas todo esse sacolejo dos anos que vem.
Assim, o futuro é o próprio presente liberado na consciência. Convém promover rapidamente a cura a fim de conduzir com menor dificuldade o ‘sacolejo’ do transitar denso da matéria através do tempo.
“Por enquanto a decadência, digo nada."
No entanto, neste momento da história, há uma suposição de decadência, e não se pode dizer quase nada sobre isso.
Adeus.”

E com esse Adeus a mensagem retorna ao Lugar Sagrado de onde veio. Salve a garota, que disponibilizou este proceder, salve ao Espírito Santo, que nos ajuda sempre, e que continuemos sempre em nossa mente certa, nesta intenção em ouvi-Lo. Amém.


[1] Obviamente, há controvérsias a esse respeito, mas caso se queira trocar daqui por diante “Akhenaton” por “Abraão”, “Arameus” ou “Medianitas”, a discussão permanecerá essencialmente a mesma, pois palavras são “símbolos de símbolos”. Elegeremos continuar com Akhenaton apenas por conta do conteúdo da mensagem que analisamos.
[2] Aqui provavelmente usado no sentido de tornar conveniente (Dic. HOUAISS, acepção 2).


sexta-feira, 13 de maio de 2011

Uma fábula para leitores do UCEM


Para Vitor Meireles e Lillian Paes.

I – Separação.

Na pequena rua central da cidade de Jerusalém, próxima ao templo antigo, via-se um amontoado circular de pessoas, todos homens, algo que já se sabia o que era e representava, pelo costume comum do Sinédrio, mas ninguém se apiedaria dos resultados. A lei — dizem — quando é imposta, significa meramente a ordem, e nenhum quer ser contrário à ordem, até mesmo para não ter que partilhar um destino como o de Estevão, que vinha pela rua, trazido amarrado, já açoitado de um tanto, amordaçado para seu próprio bem, pois este Estevão era um que dizia advertências inadmissíveis acerca da religião judaica, imperiosa à época naquela região, e eram acusações de modos graves e em formas de enleio, acusavam, pois eis que este Estevão propunha o que chamava de Caminho, e as pessoas que o escutavam criam nisto: havia uma possibilidade de salvação, um estado de espírito para cada um de nós partilhar, em formas de sabedorias e paz, ao modo do que fora divulgado por outro, um que se chamava Yeshua — o exemplo mestre de Estevão — um homem que diziam santo e que morrera na cruz dos romanos, mas antes vivera naquela região ensinando a paz da mente, traduzindo a dor em vida, em suas formas literais, como se vê nos olhos mansos. Pois Estevão escutara de um amigo deste Yeshua, que chamavam Apóstolo, o recado da paz de Deus, da possibilidade do homem viver feliz, e então compreender estes ensinamentos e divulgá-los. Reuniu-se com outros seis, e passaram anos estudando as referências orais que recebiam, aqui e ali, até mesmo de outros homens que viveram com Yeshua, como um certo Tadeu e outro André, que anos antes já vinham pregando o que viria a se chamar depois de evangelho, mas que Estevão dizia em raiz de etimologia apenas ser uma boa nova, sem sobrecargas de novas semânticas.
Pois ali, naquela rua, agora eram os fariseus que se reuniam para apedrejar Estevão. O homem este, de modos serenos, embora judiado, de tanto se ver que babava, posto sangue e alguns arranhos e roxos, estava ainda de pé, em meios moles de apoio, mas o olhar, sempre firme em calmo, era a força daquele homem, que se via — e até doía em que tivesse os olhos para ver — pois se via nele o olhar sereno do perdão. O círculo — de homens, de lei, de juízo — desmontava suas formas a modos de cada qual escolher no saco posto próximo as melhores pedras fossem, sopesando os próprios medos — as projeções de muita culpa eram juízo de toda pena de morte.
Saulo escolhera três. Nenhuma pontiaguda, devido o costume, pois estas podiam gerar ferimentos mortais muito rapidamente, não dando tempo ao condenado para refletir durante a duração da pega, para pedir perdão contrito pelo método da dor, pois o apedrejamento era para ser um instrumento pedagógico, no qual o sujeito, recebendo as pancadas, percebia-se culpado, e morreria glorioso, pedindo o perdão que não saberia pedir de outra forma, e isto, para quem assim entendesse, era uma maneira de amar. Ou ao menos de salvar aquela pobre criatura que não entendia ainda sobre o que os apedrejadores não sabiam nada, mas se alguém se achegasse até algum dos homens deste círculo hediondo e perguntasse como poderia um homem se salvar por meio da dor, nenhum saberia responder, e talvez o questionador fosse apedrejado também, para ser perdoado da blasfêmia de perguntar a quem não sabe responder, mas executa.
O amigo de Saulo, Filipe, lhe chamou ao lado, e disse: — este não vai morrer rápido. Não está nem chorando ou participando ódio. Então dá pra pegar dessas aqui, ó: e apontou para o amigo algumas pedras que continham rispas cortantes em formato quase lâmina. Saulo, então, disse: — assim não, Filipe! Ora, não vai se dar o tempo para o homem pedir seu perdão? Então riram, pois Saulo era ingênuo, e o ingênuo pode ser muito tolo às vezes. Além de tudo, era jovem demais àquela época. Ele realmente acreditava que o ódio tinha sua parcela de clareza, pois mesmo deus, esse, o minúsculo, que se acredita sendo, mas não o é, tinha condenado alguns à morte. Esse deus, na verdade, era apenas um entendimento insano, um ídolo, mas não se sabia disto àquela época, e o melhor efeito deste entendimento inverso era punir, para expiar.
Trouxeram Estevão, e ele foi posto no centro do círculo. Teve a mordaça retirada, mas permaneceu em silêncio. Os homens — uns vinte — continuavam sopesando as pedras à mão. Alguns sorriam fino, discretos, imperceptíveis por volume espesso de barba, aspirando ao momento de prazer escasso que seus egos permitiam. Em outros, no entanto, se via mesmo que estavam impacientes, chutando a terra seca e levantando o pó, enquanto gritavam trechos do Antigo Testamento, amalucado por eles, e cuspiam em Estevão, com escarros, e depois açoitavam pontapés.  Um homem começou a cavar o buraco no qual enterrariam Estevão até a cintura, deixando suas mãos livres, para se defender, pois isto era ato de justiça, conforme a lei. Primeiro falou o rabi, que apontou o motivo, declarando culpado Estevão por atos divulgados de idolatria, e por ser ele mesmo um idólatra.  Os homens no círculo em volta soltavam gritos urros, felizes feras, e, assim, estavam mesmo grunhindo impávidos uivos de dor, que se percebia, como estivessem alegres, e a quem assistisse a tudo aquilo era tão estranho perceber, que o mundo estava ali entregue à loucura.
Estevão foi posto no buraco cavado até a altura de sua cintura. Os homens ali presentes insistiam em levantar a poeira com pontapés que alteavam nuvens ocre. Saulo, inadvertido, aspirou um tanto de poeira: um levante ocasionado pelo homem ao seu lado, que dizia barbarismos e sorria sua falta de dentes para o jovem Saulo, enquanto escolhias as pedras. Saulo assustou-se com aquela loucura, pois avistava também Filipe, seu amigo, cuspindo alto, gritando, e de alguma maneira percebeu-se dividido em relação a tudo aquilo — por um instante, um único instante — e eis que foi suficiente.
— Saulo! — berrou Filipe — pega a pedra! Tá pensando em quê, ô, ô, olha lá, olha lá!
E Felipe apontava para Estevão, pois o rabi cobria-lhe a cabeça com o branco pano formato saco e os homens não sabiam o que faziam, e àquela época eram praticamente todos, e assim damos graças a Deus ao Sermos.
O rabi afastou-se de Estevão e todos passaram a um estado eufórico, alguns até babejavam. Então atiraram a primeira pedra, e o que se viu foi uma mancha, que circulou encarnada um ponto lateral do saco branco, e, lentamente, crescia em seus vermelhos, como uma flor do mal que desabrocha em bom jardim. O homem banguela que estava ao lado de Saulo sopesou bem a pedra que mantinha â mão, arqueou o corpo para trás, por torção de cintura, esticou o braço mais atrás ainda, até que o equilíbrio somente se manteve quando levantou uma das pernas para frente, ao que a utilizou como uma alavanca ao corpo atirando à frente o braço catapulta — e acertou em cheio o dorso de Estevão.
Então, o banguela sorriu sua ausência de sorriso para Saulo e Felipe, e gritou:
— Atira, atira, acerta! Hé, hé, hé.
Assim, Saulo sorriu fino e atirou a primeira de suas pedras.

II – Percepção Certa.

Saulo! Ô Saulo! Gritava insistentemente Filipe: que foi, hein, hein, unhf! Como vais argumentar que ficaste aqui, Saulo, perdendo tempo, pensando, como se fossemos combater milhares, com todo esse batalhão aqui fora montado, para perseguir um homem só, desarmado? Tá pensando em quê? Você pensa muito, Saulo! Ação! Ação, homem! Morte ao Barnabé!
Assim, Filipe exortava o amigo, o líder dos soldados romanos, Saulo, a levantar-se e tomar uma atitude. Eis que vários anos já se havia passado desde o apredejamento de Estevão. Saulo agora era soldado romano, comandante, e Filipe era seu imediato ordenança, ativado por honrarias de bravura crueza em divulgar o ódio, que diziam patriotismo, mas nutriam por si mesmos, projetados nos cristãos, que perseguiam com empenho devotado aos inversos.
O homem que Saulo queria capturar e matar chamava-se Barnabé. Era outro da linhagem de Estevão. Parecia que, de agora em diante, depois daquele Yeshua, desses nunca mais faltariam, e era preciso acabar com todos, assim pensava Saulo, e emendava em planos de perseguição. Isto é a Vontade de Deus! E seria assim agir em Sua vontade.  Ademais, parecia certo, pois Deus mesmo poderia voltar e atirar um raio contra ele, ou sete pragas contra seu povo, ou demasias de outras tiranas vontades que Ele promulgava para Seus Filhos, e eis que Deus, certamente, fosse assim, deveria odiar os homens. Saulo, que chegara a absorver essa concepção insana de Deus, temia saber de qualquer outra coisa que não fosse favorecer os atos que lhe impunha a forma de matar, matar, matar, pois isso lhe parecia a cura, pela eliminação do assunto.  
Barnabé, o outro, era um antigo rico, que um dia vendeu tudo o que tinha e entregou aos apóstolos, para tornar pública a Mensagem, e assim passou a caminhar pelo mundo a divulgar o que lhe foi dado divulgar, e era a mensagem do Caminho, do empenho em se rever a Deus sem medo, através do ato amável do perdão. O perdão, este ele dizia ser a cura para o mal da alma, pois somente o perdão conseguiria irradiar no mundo o amor, semeando a Palavra, e Barnabé queria ser veículo, cumprir sua função aqui, de sua melhor maneira, que era através da Mensagem. Assim, Barnabé tornou amigo daqueles que incentivaram Estevão.
Certo dia os apóstolos trouxeram a má notícia: Saulo estava a caminho com as tropas. Dali onde estavam os soldados até aqui, Damasco, seria dia e meio, dois, no máximo. André falou a Barnabé que melhor seria então se esconder por uns tempos, ir quem sabe à Antióquia, aguardar que alguém aplacasse a fúria de Saulo, manter-se isolado, sem divulgar a palavra, sem cumprir sua função. Barnabé redarguiu que estar com Deus era seguro. Na verdade, era a única coisa segura que se poderia fazer. Então, prosseguiu com seu plano, e foi para a cidade de Damasco pregar a palavra. André, Tadeu e Mateus seguiram para o Chipre e até a Antiópia, pregando também a palavra, e cada um foi para um lado, estando todos unidos. Embora houvesse a temida opressão, embora a ferocidade de Saulo, embora tudo. E, naquele momento, distante dali, sobre a barraca, Saulo estivesse tão indiferente aos anseios gritos de Filipe, conjurando mais e mais de seu tão antigo ódio.
Mas Saulo deixou seu aposento — na verdade, apenas uma barraca de campanha melhorada, com aspectos de conforto, mas era mesmo uma hospedagem de guerra. Lá fora, percebeu seus soldados descansando. Alguns em roda conversavam, outros afiavam as espadas, mas havia uma fogueirinha ali que trazia uma luzinha a todos aqueles rostos  enegrecidos pela noite, e Saulo os viu com uma espécie de compaixão profunda. Ao seu lado, Filipe argumentava em favor da fúria, que era para irem logo, matar logo, matar. Para quê então ficar aqui perdendo tempo, ô, ô, Saulo, vamos! E, perto dali, um cavalo relinchou. Mas Saulo não estava em seus meios de mal ouvir. Na verdade, estava imerso em um inadvertido estado pacífico, um silêncio interior que fazia com que os sons externos fossem apenas o contorno daquilo.  Olhava para as coisas com o imprevisto olhar de quem apenas vê o visto, e não pensava sequer em Barnabé ou glórias de promoção hierárquica, queria só ser a si, só. Ali, em estado de gente, Saulo entendia o que não entendia, mas quando pensou nisso, perdeu, e lhe veio o som de Filipe dizendo já em meio de frase: ...então é melhor dormir, ora bolas! Onde já se viu um comandante que etc.
Saulo perdeu a paciência com os quí-quí de seu ordenança e gritou com Filipe uma aspereza: saia daqui! Não me amole! ——— Filipe assustou demais...
A ordem do chefe assim tão imperativa em termos de mau humor, com ele, logo com ele, tão smegoalmente amável. Assim Filipe sentiu despeito, alimentou dois orgulhos e saiu de perto do chefe, em modos de sim senhor, sim senhor, embora não deixasse de complementar: mas o senhor deveria ponderar, sim, ponderar sempre, não se esqueça comandante Saulo. E sumiu no escuro, afastado da pequena chama da fogueirinha.
Alguns soldados observaram aquilo e se assustaram demais. Ora, se Saulo tratara assim seu ordenança, imagine se viesse para o lado deles, meros acessórios, Saulo sempre fera, criso em seu semblante? Era a morte ali! Então, todos se tornaram muito muito circunspectos. Um deles quis até apagar a fogueirinha — os homens em torno dela já haviam até se levantado — mas Saulo de longe gritou, passando a mão na cabeça, visivelmente transtornado: não, soldado! Deixa o fogo aceso, pode deixar. Melhor assim. É que eu...mas Saulo não soube completar a frase, e saiu em passos largos em direção a uma clareira ao lado do acampamento onde estavam.
Chegou à clareira rapidamente, e pouco depois alcançou ouvir que o burburinho bom dos soldados se refazia aos poucos. Saulo negava até a si, mas gostava de vê-los assim descontraídos. Ele queria poder dizer que gostava daqueles homens, a maioria eram fiéis ao seu comando, e que de muitos ele até simpatizava. Mesmo aqueles dos quais não simpatizava, eram disciplinados, pois não sairiam daquele pelotão por nada. O trabalho mais fácil do exército romano era servir ao centurião Saulo. Ora, sair na busca de cristãos era o melhor trabalho do mundo! Os caras dificilmente revidavam, não tinham exército, estavam sempre em pequenos grupos, e a população, embora argumentassem algo em favor deles, estavam sempre dominados pelo medo. Então, era muito bom ser soldado de Saulo, era como fazer parte de uma legião.
Permaneceu na clareira por um bom tempo, totalmente dividido. Em parte, a memória da beatitude que experimentara a pouco lhe recordava a paz; por outra, uma série de obrigações representadas pelos conselhos de Filipe lhe diziam que deveria partir. Não sabia como retornar ao instante santo. Tinha medo do que não entendia. Aproximou-se de uma árvore e pôs uma das mãos espalmada sobre o tronco, apoiando assim o corpo exaurido pela estafa em pensar. Então, disse em voz baixa, mas com a firme convicção dos cansados: “Meu Deus, dá-me a tua lei”, conforme um costume da época. Assim, quando definitivamente se rendeu à exaustão e desistiu do que fazer, Saulo ouviu um pensamento em sua cabeça que disse: “Saulo, eis que a lei é tua”.
Ele rapidamente empertigou-se e olhou para os lados desembainhando a espada. Sabia que ouvira apenas um pensamento, mas era uma Voz muito lúcida para ser o seu pensamento conforme o percebia, e ficou estupefato por não ver ninguém, embora de certo modo soubesse, mas não admitisse, de Que se tratava.
Saulo caminhou de um lado para outro na clareira, não sabia mais em quê pensar. Olhou novamente para a árvore e estacou de seus anseios, viu apenas uma imagem, ao que parecia que era apenas ele sendo apenas isto: via o que via, e não pensou nada mais, não houve nenhuma série de conflitos mentais dos quais estava acostumado a perceber. Filipe era uma lembrança muito antiga, desnecessária agora. Olhou apenas para a imagem da árvore, e ficou novamente encantado, imerso em um estado de total vibração, pois ele reverberava com a imagem que era a paisagem à sua volta, e estava em estado pleno de si. Seu coração batia forte, ele não sabia o que fazer, pois estava ainda dividido. Mas em um momento de atenção profunda, em que percebeu um pequeno pássaro noturno que pousara no galho da árvore à sua frente, manteve-se maravilhado com a sensação pacífica de estar-no-mundo, e eis que o pensamento voltou e lhe disse: “te farei uma pergunta, uma única pergunta, Saulo, que desfará todas as outras. Para isso, segue agora para Damasco.” E eis que ele  fielmente obedeceu a essa primeira ocorrência.

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Esta é apenas uma fábula que nos ajuda a compreender alguns conceitos do livro Um Curso em Milagres aplicados em uma relação mitológica. O restante da historia, conforme a tradição estabelece, já conhecemos, pois esta é uma versão ficcional do período imediatamente anterior ao da bíblia, quando o apóstolo Paulo, ainda chamado Saulo, preparava-se para perseguir e matar Barnabé. No caminho para a cidade de Damasco, recebeu a Revelação, manifesta sob a forma de uma pergunta: “Saulo, Saulo. Por que me persegues?”. Adicionamos apenas que o nome Saulo provêm do hebraico: שָׁאוּל- Sha'ul;  " aquele que pediu, aquele que orou por, ". Assim, pedimos que nos ajude também a Deus, amém.


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quarta-feira, 11 de maio de 2011

Retratos Intuitivos de Meus Amigos - Judson Soares

Judson Soares saltando obstáculos


Meu amigo Judson Soares não concede ao ato irracional. Pensa muito, mas às vezes é alheio ao que dita isso — embora meu amigo seja administrador, formou-se em festa que foi o mesmo que seu coração — tanto de gente dentro — e, assim, meu amigo esteve em vias de eu vê-lo inteiro. Eu e meu amigo Judson Soares: somos muito aprendizes nesta vida. Alguns ditam dele contrários — cantigas de maldizer — chegam a ele contrafeitos, meu amigo às vezes irritado, comprazendo do amor pelos inversos, noutros modos de bom-dia, boa-tarde, boa-noite, suas formas corrigindo, meu amigo trabalhando. Para ele falei do Curso em Milagres, estou certo de seu intuito em algum dia espertar Nele. Leva consigo a família que tão belamente criou, e assim é pai e chefe de boa escolha, sua vida progredindo. Seu filho é o todo amor dele, e nele aprendeu seu tanto, como se aprende com a criança a pureza de coração. Quis os grandes aviões para alçar decerto voos, fez escala em mês de maio, sua vida é um “fazer o meio de criar no mundo”.  Aproximo meu amigo das grandes competências, advogo ainda por seu coração imenso, nada preso em burocracias improváveis. Assim, meu amigo Judson ensina outros a voar com ele, meu amigo professor, com planos de pilotagem. Salve seu ponto de apoio, sua força, os jardins de sua maior generosa razão. Salve meu amigo Judson Soares!

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domingo, 1 de maio de 2011

Uma oração

Obrigado a ti!


Agradece ao receber gratidão. Liberta-te de toda a ingratidão para com todo aquele que torna pleno o teu Ser. E deste Ser ninguém é excluído. Agradece por todos os incontáveis canais que estendem esse Ser. Tudo o que fazes é dado a Ele. Tudo o que pensas só pode ser os Seus Pensamentos, compartilhando com Ele os santos Pensamentos de Deus. Recebe agora a gratidão que negaste a ti mesmo quando esqueceste a função que Deus te deu. Mas jamais penses que Ele tenha em algum momento cessado de te agradecer.
(UCEM – LE – Lição 197)

Venho diante de Ti, meu Pai, para saber agradecer. Não sei se ainda sei rezar, aprendi em outras formas, me detive em muitos meios que julgava vantajosos. Não sei como dizer do quanto Te quero, que quero mais que tudo, pois Tu és tudo. Percebo-me com medo por esses dias, Pai, dias ruins, mas não valorizo o medo. Quero sentir o medo adequadamente, e, por meio disso, quero dizer que aceito sentir medo somente até quando eu puder distinguir bem, e que seja para breve esse tempo e este perceber da minha mente dividida. Assim, empenho-me para fazer a escolha certa sem me esteirar em ilusões, para alcançar a Tua glória em ser a mim mesmo, para que eu possa ser-me grato por liberar a mim mesmo, e assim possa eu ser finalmente grato aos meus irmãos e liberá-los. Não posso te pedir coisa alguma, isto já percebi, pois seria o mesmo que puir o pedir. Neste mundo da matéria, o que peço são os meios que transmitam paz ao mesmo mundo, para o retorno de todos, meu Pai, para que não haja mais a guerra entre meus irmãos, nem entre mim e meus irmãos. Estou cansado, meu Pai, mas sei que é assim por minha tão pouca visão, meu empenho distraído, minha paz escalavrada pela dor que é mentira e enleio em suas formas de fazer com que os outros tenham de mim piedade. Pai, que eu tenha de mim mesmo piedade, que eu saiba ancorar apenas o anseio necessário ao entendimento certo; que eu possa, livre de emoção, olhar para o mal e saber fazer a escolha por Ti. Assim, peço-Te a intervenção, que me julgues pronto quando acreditares sê-lo, e me despertes Pai, em teu Reino, e que faças de mim um meio através do qual permaneça aqui em corpo ajudando ao Teu propósito. E assim, peço-Te que no dia em que eu puser os pés do lado real da vida, para cá eu não volte mais. Assim eu peço, espero tê-lo feito em minha mente certa, e agradeço por Tu teres estendido a este mundo a alegria, assim como agradeço a mim mesmo por percebê-la. Que seja assim com todos os meus irmãos, meu Pai, que, como eu, não sabem o que fazem — ainda. Amém.


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