segunda-feira, 29 de abril de 2013

Um sonho que tive - IV


Acordar para o sonhar do mundo



Sonhei que estava à procura de um estúdio para ensaiar música em Natal. Encontrei-o, e logo me vi sentado, conversando com uma jornalista, que estava toda de branco, em um vestido todo branco. Perguntei-a se não havia em Natal um Centro de Artes ou um Complexo Cultural, ao que ela respondeu que sim e admirou-se que eu nunca reparara. Então, fomos até uma bela encosta, com certo estilo vitoriano na mobília dos banquinhos que se via por lá. Em esplanada dava para ver um pedaço de mar, donde havia uma ilhota de recifes no meio; e toda a imagem brilhava em água prateada pelo luar de uma lua que não lembro ao certo se estava visível.
Estávamos sentados eu, ela e minha esposa, quando, de repente, uma torção de serpente marinha revelou um trecho do corpo do animal emergindo do mar em partes, pois se via apenas uma alça deslizante. Ainda apontei para lá e disse: ‘olha! Uma baleia!’ Mas a mulher de branco logo desceu a encosta por uma escada que por ali havia e começou a enfrentar a tal serpente, que tinha cabeça de dragão e era enorme. A serpente veio até a costa e comeu a cabeça da mulher. Então, seu corpo sem cabeça se transformou em dezenas de caranguejos. Neste ponto, acordei.


 O sonho, segundo a perspectiva de nosso currículo, é o lugar no qual o ego define o mundo à sua maneira, extrapolando em formas seus intuitos não realizados. Obviamente, mesmo em tal contexto, os símbolos podem ser interpretados como uma evocação da mente certa, quando instituídos em certeza de propósito, pois o inconsciente é uma vasta ilusão em pensamento, sendo ele mesmo imagem e produtor de forma, quando alcança o pensamento. Assim, podemos resumir que o sonho noturno é uma reverberação da separação, pois suas imagens ocorrem também através de formas. Quase tudo o que ocorre no sonho noturno tem a ver com a separação em si, e símbolos apenas apontam para a direção do sonho no formato “mundo”, revividos no formato “sonho noturno”.
Quando tens um sonho, interpretá-lo é uma busca pelo significado do símbolo, empenho pelo qual não se atém nenhum tipo de garantia. O sonho, enquanto é sonhado, ocorre no “agora” do sonhar, e não quer dizer que este “agora” tenha algo a ver com o tempo, pois já discutimos anteriormente que o tempo nos sonhos noturnos é obliterado em favor da pulsão ou ressonância das imagens em potência. Assim, a cada vez que um pressuposto do sonho é interpretado depois, o que se está a fazer é julgar o sonho, pois nem tu mesmo possuis garantias de que o sonho ocorreu exatamente tal como está narrado acima.
No entanto, em favor de tua mente certa, faremos disto um apêndice ao teu exercício de hoje, pelo qual diremos algo acerca deste sonho.
A serpente marinha, ou dragão pluvial, atende às expectativas da mudança, pois o que está inconsciente foi “percebido”. No entanto, ainda em uma forma terrível.  O fato de o teu “eu” perceber o dragão como baleia remete ao mito de Jonas, que fala de alguém que ainda está inconsciente e é “levado” pelo mar através de outra vida. Neste caso, os exercícios cumprem o papel da baleia para ti.
Logicamente, teu impulso estético surge derivado de um fortíssimo investimento na subjetividade, conforme ocorre com todo artista. Tal investimento não deve ser julgado como ruim ou negativo, pois a subjetividade quer dizer um empenho pessoal em relação a algo, mas este empenho pode ser corrigido. Por isso se diz que a arte é uma sublimação da mente errada em mente certa. Nesse mundo é realmente um trabalho de alquimia.
Não podes ainda julgar que teu ego tem alguma coisa a ver com isso. Há de se ver que a mulher de branco, jornalista, atende em favor disto; posto que, em ego, ela busca o sonho de fama e conquistas de tarimba; mas, pelo certo, ela divulga em branco o processo de transmutação, pois o branco revela o todo, sendo ele cor e ausência de cor. Não há porque buscar presságios em sonhos, pois se quiseres sonhar o sonho do mundo, basta quereres algo com convicção em mente certa, e isto ocorrerá. Este não é um sonho em presságio, mas aponta para teus gostos verdadeiros com valor em amor e candura genuínos. Podes contemporizar acerca de suas imagens terríveis, mas isto se deve ao fato de teres medo de Ti Mesmo.
Assim, pode-se perceber que um empenho em direção aos teus desejos e em ponto de uma correção estão elididos na figura da mulher de branco. Ela pode ser compreendida como tua mente errada em branco, símbolo alquímico da transformação. O fato de o dragão pluvial lhe arrancar a cabeça aponta para a interrupção da mente errada em cérebro, pelo que o corpo, assim destituído, transforma-se em caranguejos, que em seu duplo significado em símbolo aponta para uma mutação daquilo que “anda enviesado” para o simbolismo do signo de Câncer, que evoca o “mistério” da ressureição. A pluralidade de caranguejos, isto é, a quantidade abundante deles no teu sonho, indica que uma total desordem pode ocorrer diante deste processo do desfazer da “cabeça”, mas a garantia da certeza está no simbolismo do ser crustáceo, aqui definido como uma forma que é “levada dentro de outra”. Isto implica ainda na simbólica da disponibilidade à condução do Espírito Santo. A “desordem” no movimento do caranguejo está explicada nas palavras de Jesus na Bíblia, quando Se diz: “O vento sopra onde quer. Você o escuta, mas não pode dizer de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todos os nascidos do Espírito (João 3:8)”
Obviamente, outras interpretações diferentes caberiam aqui. Sonhos são simbólicos, assim como as palavras, que são os “símbolos de símbolos”. Portanto, temos pelo menos três níveis simbólicos neste texto para divergir-lhe do real. Pedimos então que não te atenhas a isso como uma verdade em sonho de tua disponibilidade, mas certamente as figuras de teu sonho são reafirmações de teu cotidiano em direção ao despertar. 

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