segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Sobre as Criações

Obrigado a Ti!


As criações que fizestes não são “coisas”, como habitualmente se diz.  Assim, certas proposições que são ditas filosoficamente como sendo “ideias” são atomisticamente realizadas como imagens. Por isso, todo o percurso de um mecanismo de transmissão de ideias equivale a uma sensação. Se, por exemplo, dizes ao teu irmão que ele parece um anjo, a isto estás projetando um sentir a ele como um ser espiritual, um transmissor de paz. Ainda assim, poderíamos dizer que um irmão sobre o qual te equivocas e dizes dele que é pernicioso transmite para ti uma referência de permutabilidade, na medida em que trocas a teu irmão por um conceito. Portanto, a ideia que tens de teu irmão será o teu irmão para ti, quando pensares ao avesso da criação.
O que ainda queres aqui? Onde acreditas que terás paz aqui? Será que se fores um artista terás paz por isto? Ou será que sonharás um novo sonho? O que vieste fazer tu não sabes. O queres fazer, tens medo demais. A ideia que tens do que é querer fazer o que queres é assustadora para ti. No entanto, somente ser Quem Tu És poderá salvar a ti e aos teus.
Criar é o mesmo que ser, pois é o mesmo que estar em si. Criar significa desprender-se de conceitos e embarcar na onda de ser o que se é. Criar virá então de outra ideia, que não transmite pelo conceito, mas se esteia na segurança de ser apenas o simples ser. O que envenena o criar é o aposto em colocar desejos entre as crenças que estabeleces. Seguramente, uma pessoa poderá dizer-te que criou um filho, ou que acertou um jeito. No entanto, criar é muito mais que estar em modos de ser um pai ou um inventor. Criar é estar em glória por saber de si. Assim, pode-se ser pai ou inventor, e apreciar a verdade das criações, que são os simulacros. Jamais aqui alguém foi pai, ou mãe, ou qualquer coisa que seja. A metáfora envolvida na reprodução implica na ordenação que evoca. Alguns sabem o que é o amor incondicional, pois tiveram filhos. A estes, esta evocação simbólica se materializará em outro ser, que será verdadeiramente amado, ao qual se chama um nome, e que intui a si próprio um ego, pois foi criado à imagem e semelhança de quem o gerou. Quem sabe de si, sabe muito pouco de ser pai, pois ser pai é transcender a si em outro, o que é uma metáfora da criação. No entanto, como diz o Curso, os filhos geram seus filhos, embora não possam gerar seus pais.
Criar é estender. Em uma acepção muito grosseira, criar equivale a uma transferência. Um sentido muito similar ao de criar está explícito na imagem da palmeira. A palmeira se estende para cima e não produz frutos comestíveis, e nem é frondosa ao ponto da grande sombra. No entanto, a palmeira é uma bela árvore, e um corredor delas estendidas lado a lado formam uma claraboia muito interessante de se passar por.  Assim, criar é como a imagem da palmeira isolada, que estende em si uma “potencialidade” de ser integrada a um todo que assume por si características que faltam ao elemento unitário. Esta é a noção das ideias de Platão, que se dirigem ao universo da criação mediante um princípio de extensão. A característica que auxilia o ponto de mutação entre o sujeito que faz e o filho de Deus que cria reside em perceber não mais a materialidade de suas criações, mas as potências que advém de estarem probabilisticamente alinhando-se com um evento disponível como um Todo. Voltemos ao caso da filiação, no sentido corriqueiro, isto é, os filhos dos homens. A filiação, entendida como a soma de todas as pessoas que nasceram neste mundo, será apenas uma aliança muito pobre do que é a Filiação Unitária entre os Filhos de Deus no Reino. No entanto, como todos os filhos são filhos de alguém, são também criações, e podem estender e procriar, pois estendem por si o que receberam. O amor da filiação por suas crianças não pode ser entendido como o amor de Deus por Seus Filhos, pois isto está além da capacidade de se apreender por comparação. No entanto, a Filiação é una, assim como os pais e os filhos são os mesmos nos termos de pertencerem a apenas uma filiação.  Criar é ser uma atmosfera que abarca um sistema vivo que não se entende como um todo orgânico, embora seja em si uma única coisa.
Dificilmente pode-se dizer em abstrato o que são as criações, por isso usaremos um exemplo: Criar é ver o que se desenrola em tua frente sem nenhum vestígio de julgamento. O que se apresenta a partir de teu próprio observar e nos encaminhamentos que a vida proporciona, são tuas criações, que muito bem podem estar equivocadas, e assim tens aquilo a que chamas “dias ruins”. Mas a verdadeira criação é natural, e por isso se diz que ela está alinhada com Deus quando é apenas imagem, e representa apenas aquilo que gostarias de criar no mundo. A onisciência necessária para tal criação não vem de ti, mas tu partilhas dela, assim como a palmeira, que não é a claraboia, é em si palmeira e claraboia. Por isso diremos agora a ti: és como a palmeira, pois és filho de alguém, foste permitido à paternidade, e ao teu redor vês aos teus irmãos algumas vezes como iguais em claraboias de encontros.
A criação é como um sonho de fabricação gentil, que advoga pelo Reino e que não acede ao propósito de separar. Criar é unir. Criar é crer em uma realidade diferente, contudo possível, e assim partilhar de teu sonho no sonho do teu irmão com dádivas gentis. Retira uma flor do sonho do teu irmão e devolve-a a ele. Isto é criar!

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