domingo, 23 de janeiro de 2011

UCEM - A ilusão do pensamento impuro.


Muitas vezes busquei o arrependimento de um pensamento meu, julgado como impuro, através de formas de autopunição. Algumas eram inconscientes, mas manifestavam-se sempre como uma forma devotada ao sofrimento, como:  auto-encarceramento, repreensão interior, votos por “endireitamento” moral e outros tantos que nada me fizeram além de mal. Estes atos não me emendaram nem tampouco trouxeram espécie alguma de paz. Foram meros atos vazios, de refletir continuadamente sobre o erro que se faz, o erro que se pensa. Contudo, existir não é um erro — qualquer mínimo instante de alegria vivenciada atesta isto. Somente uma pessoa atormentada pensaria diferente, e o tormento pede cura, não mais perturbação. Mas acreditar em emendar-se moralmente através do perpétuo pensar purificado pode gerar apenas mais perturbação, se este ato for realizado de modo insano.

Pensar livremente é uma ilusão. Pensar é apenas uma opção que se faz entre duas formas de acepção. Uma é consciente e a outra inconsciente. Estar consciente de uma maneira própria de pensar exige o ato perene de não julgar o que se pensa. Não julgar nada. Pois julgar o que se pensa é apenas julgar a ti mesmo. Desta maneira, o pensamento julgado impuro te julgaria também como sendo impuro. Geralmente disto nada fica. Espero que vocês me entendam. Não roubei do imposto de renda, mas o exemplo suscita julgamentos, e é disso que se trata este artigo: jamais julgar. Julgar ninguém. Julgar nada.
É fácil. Na verdade é a coisa mais fácil do mundo. Costumo dizer aos meus amigos que Jesus Cristo era na verdade o sujeito mais simples que passou pela terra.  Sua simplicidade será sempre digna de nota, pois trará a nossa. Seja pelo exemplo que deu de Si, caso o leitor seja de pouca fé; ou pela glória de Nosso Senhor Jesus Cristo, nosso Mestre, nosso Irmão Maior, Filho de Deus, se forem de fé creditada a Deus aqueles que até aqui vierem. Independentemente, não custa nada agradecer a alguma coisa, seja a Deus, seja através do simples e sincero bom-dia a um porteiro.












© Colin Hill

Voltemos, contudo, à discussão sobre o pensamento impuro. Chegará o dia — oxalá seja hoje — em que teremos condição de perceber a acepção de apenas pensamentos puros. Estes nos são dados. São claros como o dia, e não pedem esforço algum de nossa parte para existir. Exigem apenas o não-julgamento como prerrogativa. Contudo, nem todo pensamento que chega a nossa cabeça será puro enquanto estivermos conflitados. Estar conflitado é meramente não saber abandonar o julgamento. Enquanto estivermos inclinados a julgar, seremos os juízes de nós mesmos. “Não julgueis, para que não sejais julgados” (Mt 7:1-5). Contudo, convém manter este entendimento:  o julgamento nunca vem de outro, como se fosse uma resposta exterior. O julgamento é auto infligido, e apenas visa conflitar o julgador. Esse conflito toma forma de pensamento, geralmente como uma questão qualquer, que lhe foi colocada, a qual o julgador quer dar uma resposta. E tão logo o julgador chegue a uma conclusão — geralmente insana — outra questão que lhe exige julgamento é apresentada. Esse ciclo é óbvio, mas não conseguimos enxergá-lo com clareza. E é esse enredamento que nos impede a pura paz.


Para tudo, vale um exemplo. Há um grande livro na literatura brasileira chamado “Grande Sertão: Veredas”. Sérgio Buarque de Holanda dizia que o volume dele já estava redondo, de tanto ler e reler. É uma grande obra, escrita por João Guimarães Rosa. Neste livro há um trecho que explica o que vínhamos discutindo. Na batalha final, do bando do jagunço Riobaldo contra o Hermógenes e os Judas, aparece uma voz estranha, que desenreda o destino de Riobaldo. Ele está colocando a cartucheira de balas e as vestimentas para a guerra, quando uma voz estranha “aparece” na cabeça dele, incitando-o a desistir da batalha, julgando seus companheiros. Eis o trecho:

“E eu acabei de me enroupar, mal mal, e escutava essas vozes: — Tu não vai lá, tu é doido? Não adianta… Não vai, e deixa que eles mesmos uns e outros resolvam, porque agora eles começaram tudo errado e diferente, sem perfeição nenhuma, e tu não tem mais nada com isso, por causa que eles estragaram a guerra… Assim ouvi, sussurro muito suave, vozinha mentindo de muito amiga minha.”
Notem que o “pensamento” que Riobaldo ouve acusa sempre os outros, ou seja, julga. É uma “vozinha mentindo”, muito amiga dele, comum, que está sempre a ocorrer disfarçada de pensamento, como sendo o juízo próprio do ouvinte, mas vimos serem apenas “sussurros malignos”. A palavra “maligno” às vezes assusta, mas podemos trocá-la por ilusão. Muitas vezes, recorremos à ilusão de acreditar que somos o que pensamos, por conta de altas alegorias, e assim duvidamos da nossa própria capacidade de pensar, que é passível de existir sem atacar nenhum irmão, sem fraquejar nossa coragem. O personagem Riobaldo estava tão perturbado com seus modos alheios de pensar que chegou a acreditar ter feito um pacto com o diabo. Isso é estar conflitado.


Julgar um só pensamento como impuro é o suficiente para nos levar ao conflito, pois, ao agirmos assim, acreditaremos que somos nós mesmos também impuros, misturados ao erro, o que é impossível, pois somos Filhos de Deus, que é só Amor, sem julgamentos, e que nos espera pacientemente por toda a eternidade pelo despertar da consciência de Seu Querido Filho, pois o tempo cronológico assim como o percebemos é também uma ilusão.

Não gostaria de deixar o leitor sem uma sugestão prática. No livro “Um Curso em Milagres” é possível encontrar a seguinte afirmação: "A condição necessária para o instante santo não requer que não tenhas nenhum pensamento que não seja puro. Mas requer que não tenhas nenhum que queiras guardar”. Portanto, na próxima vez que tiveres um pensamento julgado impuro sobre uma pessoa, uma situação, uma ideia ou em qualquer outra coisa, lembra-te sempre de evitar se equiparar ao juízo emitido. Se vieres sem fé, pensa ao menos em como tu nasceste puro, pensa em um recém-nascido, pensa com carinho na impermanência de todas coisas, que tudo passa, que és capaz de amor, de seres amado, és amado agora, meu querido, mas não sabes disso. Mas se fores capaz de uma nesga ao menos de fé, um pequenino empenho em direção a Deus, serás ouvido. Então, quando tiveres pensamentos julgados impuros, entrega-os ao Espírito Santo, peça-Lhe que os julgues para ti, que não sejam usados para o mal, e escolhe outra vez.




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